Apertei os fones no ouvido enquanto ouvia a dança das cordas da guitarra tocada por Mark Knopfler, me peguei rindo sozinho e viajei no tempo até aquela noite julhina de sexta. Pouca luz, foi a única exigência dela, e meu único pedido era que parasse o tempo. Ainda lembro das tatuagens, pura obra de arte se conjugada com seu corpo era a Capela Cistina dos meus olhos. Menina-mulher e Deusa, ali estávamos juntos, com não mais que uma dúzia de pequenas velas, que tornavam ainda mais quente o ambiente, enquanto cada peça de roupa minha era arrancada à dentadas displicentes que induziam a mordidas, eu deitava na cama completamente estático, era quase patética a cena por mim ilustrada, semi-nu calçando no pé esquerdo apenas uma meia soquete branca, já ela, nuazinha em pêlo, só de pulserinha no tornozelo brilhava nos reflexos dos seus piercings, era a melhor definição da perfeição naquele momento, demoníaca e angelical, me fazia mero instrumento do seu bel-prazer, é.. fui usado, mas quem não gostaria? Abdiquei da virilidade masculina e ofereci à ela toda minha força e resistência pra fazer da noite, inesquecível. Meu corpo, parque de diversões pra minha criança, divirta-se! Nossas mãos, minhas carícias, seus beijos, mordidas e arranhões. "Vem pra mim benzinho.." suplicava ela em uma das últimas palavras de pudor que proferira. Madrugada adentro, fizemos amor bonzinho, fizemos sexo sem-vergonha, e não me lembro de ter sido tão xingado por fazer uma mulher feliz, e acho que nunca fomos tão xingados por fazer mais invejosa aquela vizinhança, que não era surda. Esquecemos da vida, fizemos parar o tempo, brincamos de Deus e criamos nosso tempo. Um solavanco, e senti sacudir na nossa cama.. Minha mente idealizou uma estranha voz metalizada que dizia: "Próxima, estação, Piedade. Desembarque pelo lado direito. Ao desembarcar atenção com o vão entre o trem e a plataforma..." Puta que pariu, e mais uma vez adormeci pensando nela.
Ah! essas mulheres..
Song 4 the moment - Private Investigations, Dire Straits